Acredito que muitos saibam do que trato no presente texto apesar de ter mudado o título da obra de afirmação para interrogação. A crítica é feita especialmente ao filme já que não li o livro no qual foi baseado, não é a minha literatura favorita. Porém, como o cinema internacional produziu um filme do nosso escritor que a muito ocupa o status de best seller em vendas resolvi conferir, afim de não ser induzida às críticas preconceituosas. Como entusiasta das artes louvo a capacidade de quem conquista a atenção do público através de suas obras. Sou especialmente voltada à obras filosóficas e a um outro tipo de literatura, mas, creio que se houvessem mais horas no meu dia acrescentaria algum outro tipo de leitura. Como sempre a favor da liberdade e da leitura desejo que as livrarias sejam cada vez mais procuradas e que cada um faça o roteiro de preferência a bordo das palavras.
Me identifiquei com a Verônica do início do filme em algumas fases da minha vida; inquietações em uma mente entre o mundo real e o das projeções, rodeada de tantas conclusões precipitadas a respeito do que poderá de vir. Passado e presente passeiam juntos em um mesmo tempo. Uma mente cheia de coisas e cheia de todas elas, a falta de sentido permeia tudo fazendo dos sonhos só sonhos... as perspectivas são as piores assim como a constatação: estou comum. A Verônica que indaga a vida e os acontecimentos, que procura algo que os fundamente é a figura do deprimido natural. As verdadeiras Verônicas que poderiam ser Jucis possuem como principal característica a complexidade de serem simples, mas nunca simplórias. Há em nós um ligação direta entre razão e sentimentos e se essa ligação é ameaçada damos defeito; BUM... Uma crise. Portanto, Verônica não decide morrer, ela desiste de viver, o que é bem diferente. Quando a vida perde o sentido ela tem necessidade de uma outra vida, ela quer dormir para acordar para o novo, o que Verônica sente é cansaço. Insatisfação une-se ao cansaço e percebam o desespero que tal soma produz; como alguém sem forças pode recomeçar?
A Verônica que segue no filme após a primeira cena não é a que o filme propunha inicialmente, ela poderia ter ficado estática, ou até estérica mas nunca boba, nunca vazia. Não é morte que se impõe ao deprimido, ao contrário, é a força da vida. O psiquiatra não precisa dar ao paciente deprimido a noção de finitude, não há nada no mundo que ele entenda mais que isso. A depressão é um estado de plena morte em vida, o deprimido não reage a certeza da morte... a vida que lateja nele mesmo é o que assusta e ao mesmo tempo o inquieta a ponto de fazê-lo reagir em algum momento, ainda que para tanto precise de boa orientação. O deprimido não é louco, o louco é feliz, loucos não entendem de depressão nem de nada que lhes encarcerem. A depressão são vontades contidas, são limites a serem rompidos ao explodir da vida que lateja dentro de um corpo. Não há nada mais cômodo para um "portador de depressão" que esperar a morte. O corpo está cansado, ele entende de esperar principalmente se em cima de uma cama. Saber que terá que viver é que o levará a atitudes de viver. Lembro-me ainda quando ouvi:
_Juci fique tranquila, você sobreviverá e viverá tudo o que tanto deseja. O seu organismo não está produzindo uma substância essencial às sensações de alegria na medida que os sentimentos de alegria que você tem precisam para realizá-los. Você não quer morrer, só quer parar de sentir dor.
Há muito mais ciência no que sentimos do que imaginamos. Se a Verônica fosse a da proposta inicial do filme teria desistido com o ultimato do psiquiatra. Verônica conseguiu sobreviver porque encontrou em alguém uma nova vida, não pelo metódo inverso do psiquiatra. Os naturalmente depressivos como a Verônica da primeira cena do filme são diferentes dos que ficam deprimidos por algum motivo. Faço parte dos do primeiro diagnóstico. A diferença entre os dois tipo de deprimido é o fato de que os primeiros tentam abraçar toda felicidade que estiver ao seu alcance pois conhecem e temem a tristeza, enquanto os outro abriram mão da felicidade que tinham que por alguma circunstância nova com a qual não aprenderam ainda a conviver.
Um dia sem quê nem pra quê a tristeza vem e faz morada... quando encontramos o primeiro fundamento para a felicidade começamos o processo de caçar alegrias, uma a uma voltamos a ser donos da nossa própria vida e quando nos sentimos preparados aprendemos a lembrar da tristeza como forma de valorizar a felicidade. Tomei como remédio uma prevenção metafísica; reconheço a felicidade e cada momento precioso dela eu salvo em mim e ela vai ocupando todos os espaços, aprendi uma felicidade também sem quê nem pra quê... E, se a tristeza vier ainda que sem o meu convite não encontrará espaço na minha festa, ficará sem ar e terá duas opções: ir embora ou ser contagiada por tanta felicidade que se confunda e se perca dentro em mim servindo apenas de fragmentos para minha poesia.
A garota que vos escreve sempre teve dificuldades em falar do assunto, até descobrir que pode transformar a agressividade em coreografia, o grito em canto e o silencio angustiante em palavras escritas. Nós, os deprimidos somos feitos de um materia diferente, nem melhor nem pior que os demais, apenas diferentes. Sou meio plástica, meio elástica e os meus fragmentos se adaptam perfeitamente a pessoa inteira e intensa que sou. Um paradoxo sim, que talvez dispense as explicações, mas nunca as perguntas. Temo sim uma nova confusão(crise), mas decidi retirar dela toda lucidez emotiva que ela é capaz de deixar cada vez que a expulso. As reais Verônicas nem querem e nem temem a morte; uma vida eterna e vazia nos afligiria mais. O tic-tac do relógio só influencia a nossa vontade de vivermos mais dias felizes que tristes... quem conhece a morte da alma não teme a do corpo. Não é a incerteza do amanhã que nos aflige, são os ontens que não vivemos; e como sabemos que hoje é o ontem de amanhã o relógio só nos importa para administrar um tempo que sabemos precioso.
Verônica não decide morrer. Verônica decide melhorar sempre...